- Devíamos ter comprado um
chocolate. - eu disse, para a garota que conhecia há oito meses e estava, pela
segunda vez, sentada do meu lado no cinema, dessa vez ela usava uma blusa preta
com alças nos ombros, bem justa e decotada.
- Verdade, a gente não pensou
nisso... - ela respondeu com o tom reticente que era característico do fim d
suas frases mal pronunciadas. Desde pequena ela tinha problemas de dicção e
errava algumas letras. Além de engraçado, eu achava aquilo lindo.
- Mas eu pensei. - rebati,
sacando do bolso uma pequena barra de Sensação, que nós dividimos no escuro. Lá
na frente, na grande tela, passava a versão moderna de "A Fantástica
Fábrica de Chocolate", com Johnny Depp no papel de Willy Wonka, e os
inúmeros estímulos gastronômicos daquela indústria miraculosa nos deixaram com
água na boca.
No futuro eu viria a saber que
ela não era muita fã de Sensação, mas que comeu assim mesmo e não falou nada
para não estragar a beleza do momento. Não é uma graça?
O filme acabou, mas eu ainda
estava em estado de atenção. Eu queria agarrá-la, beijá-la, levá-la para a
minha casa, mas como? Jovem, bobo, inexperiente e apaixonado, uma combinação
que por vezes mais atrapalha que ajuda ao lidar com as mulheres.
Ela me acompanhou até a entrada
do metrô, onde paramos para nos despedir, encarando um ao outro. Tínhamos
dezesseis anos, conversávamos ao telefone todos os dias, por duas ou três
horas, logo, quando eu a encontrava, não havia o que dizer, com meu cérebro
gritando os mais diversos comandos de avançar e recuar, enquanto olhos castanho
claros cheios de ansiedade se fixavam nos meus.
Deixei o instinto me guiar, levei
a mão direita ao rosto dela, para não errar a boca com os olhos fechados.
Beijei. Abri demais a boca, ela gostou, não porque o beijo tivesse sido bem
dado, mas porque tinha lido numa revista que os meninos abriam demais a boca
para beijar quando estavam ansiosos. Para ela, era a prova de que queríamos a
mesma coisa.